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quinta-feira, 15 de março de 2012

A Terra é de Plástico!






Com o devido exagero, seria essa a frase que Yuri Gagarin diria se fizesse a primeira órbita completa em nosso planeta num futuro (talvez não muito) distante.

É impossível conceber o mundo moderno sem plástico. Seria como lhe cortar a eletricidade, por exemplo. Simplesmente não dá mais pra viver sem ele.

Embalagens para qualquer coisa, recipientes idem, bóias de barco, isopor, roupas de nylon, tampinhas de garrafa (e as próprias garrafas), hastes de cotonetes, fitas adesivas, mangueiras de jardim, televisores, computadores, impressoras, CD’s, fios elétricos, lonas, esponjas de banho, filmes para vidros, para livros, balões, super colas, saquinhos de leite, canudos, piscinas, brinquedos, escovas de dentes, de cabelos, pentes, ventiladores, tampos de vasos sanitários, calçados, copos, caixas d’água, ferramentas, eletrodomésticos, móveis... enfim, quase tudo hoje em dia é feito de plástico. Se sua casa não for antiga, todos os canos e fios que lhe permitem ter energia e água são de plástico. Todos os interruptores elétricos quase certamente também.


E mesmo as coisas que não são 100% feitas de plástico estão aumentando sua proporção do material. Um bom exemplo são os carros. Nos últimos 30 anos a porcentagem de plástico nos automóveis aumentou de 5% para 15%. O painel dos carros hoje já é quase totalmente feito de plástico (poliacetileno/acrilonitrila-butadieno-estireno); alguns faróis, tetos solares e painéis de lataria (polibutileno tereftalato) também, bem como bancos, espumas e pneus (poliuretano), refletores (polieterimida), aerofólios, frisos laterais e de janelas (policarbonato/poliereftalato de etila), calotas (poliacetileno/polióxido de fenileno), volante e grade frontal (policarbonato), filme dos vidros (policloreto de vinila) e até mesmo os espelhos (policarbonato/acrilonitrila-butadieno-estireno). Como pode-se ver,  alguns têm nomes tão compridos que faz-se necessário tomar fôlego para conseguir falá-los.


Pra começar, todo plástico é um polímero, mas nem todo polímero é plástico. O que torna necessário perguntar: O QUE É POLÍMERO? Moléculas orgânicas simples de carbono e hidrogênio que se aglomeram repetidas e repetidas vezes, formando cadeias poliméricas (veja a figura ao lado). Nem todo polímero é artificial: bichos-da-seda os produzem, e as aranhas já os tecem desde o Carbonífero; idem às árvores, que tão logo apareceram começaram a produzir celulose, amido e lignina, e um pouco mais tarde algodão e látex... isso tudo é polímero. Até você produz polímero: o colágeno de suas unhas e ossos é um.


O besouro-laca (Laccifer laca).
E um dos primeiros polímeros naturais a serem usados é produzido por um inseto. No centro-sul asiático, ali pela Índia e Paquistão, existe um "besouro" (na verdade, um percevejo) chamado besouro-laca (Laccifer lacca) que produz uma secreção polimérica conhecida como goma-laca. Até o início do século passado ela era a única substância conhecida usada para revestir fios elétricos, conexões e daguerreótipos (câmeras fotográficas), bem como discos de vinil (os “bolachões”).

Apesar de artificial, o plástico é um polímero baseado em petróleo, que é uma substância orgânica. Portanto, suas reações químicas são regidas pela Química Orgânica, e são muito difíceis de se executar em laboratório tanto que, até a primeira metade do século XIX, acreditava-se na chamada “Teoria da Força Vital”, enunciada por um célebre alquimista da época, o sueco Jön Jacob Berzelius: “Reações orgânicas só são possíveis no interior de seres vivos, através da ação de uma ‘força vital’”. Por isso, até o começo do Séc. XX a humanidade só se valia de polímeros naturais, uma vez que ainda não dispunha da tecnologia capaz de fazer reações entre os compostos de carbono.



F. Wöhler foi o primeiro a conseguir sintetizar um
polímero natural em laboratório...
Mas voltando à linha do inseto, em 1828 um discípulo de Berzelius, o alemão Friedrich Wöhler conseguiu sintetizar uréia a partir de isocianato inorgânico em seu laboratório, derrubando a Teoria da Força Vital, proposta por seu mestre. Com a queda deste dogma, começou uma corrida pela pesquisa de polímeros. Ainda não era possível sintetizá-los artificialmente, mas a pesquisa de Wöhler mostrou que era possível alterar os polímeros naturais, visando uma maior variedade para suas aplicações.


E as descobertas foram aparecendo rapidamente: em 1835 apareceu o cloreto de vinil; em 1838, o nitrato de celulose; em 1839 o americano Charles Goodyear inventou o processo de vulcanização da borracha natural (descobriu agora o motivo para o nome do pneu?); em 1865 surgiu o acetato de celulose; em 1884 desenvolveu-se a primeira fibra artificial, a rayon de viscose; em 1905 inventou-se o celofane... mas a coisa só virou problema de vez em 1909, quando o químico belga Leo Baekeland, então em Nova York, acrescentou fenol (ou ácido carbólico de alcatrão, para os químicos mais chatinhos) a uma mistura de formaldeídos sob calor e pressão e deu origem à baquelita, o primeiro plástico da história (o nome não é mera coincidência com o do cara). Fácil de ser moldada durante a fabricação mas extremamente rígida e durável após seu término, foi um sucesso comecial. Se você tem curiosidade de saber como ela é, vá até a cozinha e pegue uma panela. Provavelmente seu cabo é feito dela. Com a baquelita, Baekeland ficou muuuuuito rico... e o mundo começou a ficar muuuuuito sujo.


... abrindo caminho para Leo Baekeland produzir
o primeiro plástico artificial da história. Por isso é

considerado o "pai do plástico".
Não apenas por causa da baquelita, mas porque outros químicos sentiram cheiro de lucro com aquilo e começaram a se trancafiar em seus laboratórios tentando inventar qualquer coisa parecida, quebrando longas cadeias moleculares de petróleo cru e misturando essas partes pequenas para saber o que dava pra ser feito com elas, quais variações do plástico original poderiam ser úteis para encher seus rabos de dinheiro. Era como os atuais biotecnólogos, pessoas que não têm nenhuma vida social, não fazem sexo, não fazem nada a não ser passar o dia inteiro fechados e isolados dentro de seus laboratórios, com um montinho de matéria orgânica (animal, vegetal ou qualquer outra), em cima da mesa, coçando o queixo e pensando “o que que eu posso inventar pra tirar algum dinheiro desta merda”...? E infelizmente, para o planeta, aqueles químicos de meados do século passado conseguiram inventar um montão de plásticos diferentes: em 1922 a borracha foi sintetizada; em 1931 surgiu o neoprene, 1933 o poliestireno e em 1939 o polietileno.


Manitoba, Canadá.
Vamos a três exemplos bem práticos: a busca por um fio artificial, capaz de substituir a seda, levou em 1929 à poliamida, mundialmente conhecida como nylon – que você, se for mulher, deve estar usando nesse momento, cobrindo suas lindas pernocas. Este "tecido" revolucionou a indústria têxtil e ajudou a popularizar o plástico; em 1948, visando uma forma de ligação entre materiais reversível de forma simples e inspirando-se nos ganchos da semente da bardana (Arctium sp.) foi criado o velcro da sua mochila da época do colégio; e em 1952, adicionando-se cloro à composição original da baquelita criou-se um plástico duro, muito resistente, conhecido como policloreto de vinila, ou PVC. Soprar gás enquanto essa mistura se formava originava bolhas duras, unidas, em seu interior, conhecidas quimicamente como poliestireno, comercialmente como Styrofoam, e popularmente como... isopor.


Barrow, Alasca.
Até antes da guerra o plástico ainda tinha um sucesso modesto. A única exceção era a já citada baquelita, usada nos fios de telefones e rádios – que naquela época eram extremamente duráveis, bem diferentes das porcarias descartáveis e programadamente obsolescentes que temos hoje. As embalagens de plástico para praticamente tudo ainda não tinham sido inventadas, então, mesmo com a guerra rugindo no Atlântico e no Pacífico, nossos mares eram muitíssimo mais limpos.

Com o fim do conflito e a disponibilidade do plástico para outros fins que não bélicos, uma avalanche de opções inundou o mundo do consumo. Novos tipos de plástico surgiram (como polipropileno e policarbonato) e começou a aparecer de tudo: caixas de acrílico, plexiglas, garrafas de polietileno, embalagens de polipropileno e brinquedos de poliuretano. De todas elas, as que mais mudaram o mundo (para pior) foram as embalagens de cloreto de polivinil e polietileno, que são transparentes e nos permitem ver os produtos, geralmente alimentos, nelas contidos, além de conservá-los por muito mais tempo. Como aquelas que envolvem queijo e presunto.
Além disso tudo, o plástico, sendo mais leve e durável, foi substituindo os materiais preferidos até então, como metal e madeira. Rádios, telefones e televisores, dentre inúmeros outros, passaram a ser fabricados com plástico.


Rio Vacha, Bulgária.
Só que em pouco tempo o lado ruim dessa porcaria de substância começou a aparecer. Nos anos 1960 cunhou-se a famosa expressão "sociedade do descarte". A despeito do fato de que descartar lixo era feito desde sempre pela humanidade, desde quando éramos caçadores-coletores, agora estávamos jogando fora uma coisa que não apodrecia, não desaparecia na natureza, e com uma terrível e enganosa vantagem: exatamente por não apodrecer e por ser seco, o lixo plástico era mais "agradável" do que restos orgânicos que liberavam líquidos fétidos se demorassem muito tempo para serem levados embora. Isso gerou uma falsa idéia geral de que o plástico era mais inofensivo do que o lixo natural, que podia atrair insetos e roedores – e, com eles, doenças.


Costa do Havaí.
Mas, em se tratando de lixo, é absolutamente fundamental que o mesmo se decomponha, e o fedor é um preço pequeno a se pagar por isso. E é aí que está a grande diferença entre o lixo orgânico e o plástico: os primeiros estão aí a tanto tempo que os microorganismos já se familiarizaram com eles a centenas de milhões de anos, e sabem como "comê-los" (ou quebrá-los em monômeros, dímeros ou até em cadeias maiores, mas ambientalmente inofensivas) e os tornarem inócuos.


Para o planeta, o plástico é uma coisa ainda muito nova. Sabemos criá-lo, mas não temos a menor idéia de como destruí-lo sem causar danos ambientais (queimá-lo não adianta muito). Não temos idéia do quanto podem durar, tampouco o que vai acontecer com eles em qualquer tempo geológico futuro. A natureza também não sabe o que fazer com ele, não existem bactérias decompositoras que consigam digerí-lo. E ninguém sabe se um dia existirá alguma que consiga.

Os plásticos ainda não estão por aqui tempo suficiente para que os microorganismos desenvolvam uma estratégia para lidar com eles e destruí-los. Até o momento, tudo que eles conseguiram foi biodegradar a parte do plástico cujo peso molecular é mais baixo – as cadeias de polímeros menores, já quebradas.


A matéria-prima do plástico é uma coisinha minúscula chamada nurdle. São pequenos cilindros, de 2mm de comprimento, que são derretidos para se fazer toda e qualquer coisa de plástico que existe no mundo. São produzidas anualmente 120 milhões de toneladas – ou 5.500.000.000.000 (lê-se 5,5 quatrilhões) de unidades individuais, das quais nem todas são utilizadas. Uma quantidade enorme delas simplesmente se perde e acaba no ambiente.


Os famigerados nurdles. Tudo que é feito de plástico é fabricado
a partir dessa porcariazinha aí.
Apesar de não serem microscópicas, são suficientemente pequenas para serem absorvidas por águas-vivas e salpas, organismos que funcionam como "filtros" dos mares. Mesmo aves como gaivotas e pelicanos confundem essas porcarias brilhantes e chamativas com ovos de peixe ou o pequenino camarão krill e também os ingerem. E agora não existe forma de se calcular a quantidade de partículas iguais a essas que estão, no exato momento em que você lê este artigo, indo em direção ao mar, revestidas por substâncias químicas tóxicas e satisfatoriamente diminutas para serem comidas por criaturas pequenas, que serão comidas por outras maiores, que serão presas de outras ainda maiores – muitas das quais peixes dos quais NÓS nos alimentamos.
E mesmo que não fossem! Seríamos, além de egoístas, estúpidos demais se nos preocupássemos apenas por um incômodo direto!


Ah, esqueci... é exatamente assim que nos comportamos...


Mas se os nurdles não são microscópicos, seus produtos de plástico estão começando a ficar assim.

Plástico granulado se mesclando com a areia da praia.


Água mole em pedra dura tanto bate até que fura. O velho ditado é verdade, como todos sabem: a ação mecânica das ondas transforma pouco a pouco pedras em areia. Só que agora ela está agora fazendo o mesmo com o próprio plástico. E não existe sinal algum em qualquer lugar do mundo de que o plástico esteja se biodegradando, mesmo quando reduzidos a esses pedaços microscópicos. E o maior problema disso é que, quanto menor o tamanho, maior o problema que ele causa.


Rio Citarum, Indonésia.
Hoje o plástico no oceano está ficando tão granulado que suas partículas já chegam a até 20μm, menor que um fio de cabelo, e quase tão pequenas que falta pouco para que sejam assimiladas até pelo microscópico plâncton oceânico. O polímero está se quebrando em pedaços tão pequenininhos que já não estão mais flutuando, mas ficam em suspensão na água do mar. Ou seja, as medidas de quantidade de plástico no mar são totalmente desconhecidas e o tamanho de seus pedaços está ficando cada vez menor, a ponto de se esconder nas correntes marinhas e entrar na cadeia alimentar oceânica, base da vida na Terra. Simplesmente não se sabe quanto plástico existe por aí. Só se sabe que estamos enchendo o oceano com um sem-número de tipos de polímeros à base de petróleo, como acrílico, poliéster, náilon, polietileno, polipropileno, cloreto de polivinil e isopor
Mas existe uma coisa da qual o plástico não tem culpa: o transbordamento de nossos aterros sanitários, vulgo "lixões".


Praia de Sidon, Líbano.
Isso porque o plástico é uma substância leve demais, mais que a maioria das outras coisas que jogamos no lixo. Se não for compactado e enterrado ou lacrado em um lugar seguro (ou ainda queimado), seu destino sempre será a água, partindo de pequenas redes de esgoto e chegando até o grande oceano, porque eles são muito mais leves do que areia e/ou lodo. A maior parte do que há nos aterros é entulho de construção e... papel. Isso mesmo, papel, papelão e afins - e dentre estes, os maiores vilões são os jornais, que são muito difíceis de apodrecer. Papel, embora frágil quando exposto a uma força mecânica, é extremamente resistente em condições adequadas. Ou você consegue pensar em outro motivo para papiros egípcios com 4 mil anos de idade? Longe do ar e da umidade, dispersores de bactérias decompositoras, eles podem durar milhares de anos. Em alguns aterros dos EUA ainda é possível desenterrar jornais da época da Grande Depressão, a 80 anos, perfeitamente legíveis.


Atol de Midway, no Pacífico.
O plástico não se compacta tão facilmente como outros tipos de lixo, e é facilmente transportável pelo vento. Assim, ele cai com facilidade de caminhões de lixo, vagões de trem, containers e todas as formas de transporte, além de voar ao vento até chegar aonde? Aonde? Héin, héin, héin!? Na água. É por isso que 80% de tudo que está boiando no mar hoje foi originalmente descartado em terra – e 90% disso é puro plástico.


A razão pela qual os aterros sanitários de hoje não estão entupidos de plástico é porque quase todo ele sempre acaba, de um jeito ou de outro, no oceano.


Só os EUA jogam fora 400 mil garrafas plásticas... por minuto.
Em 1995, um estudo da Academia Nacional de Ciências dos EUA estimou que todas as embarcações do mundo juntas produziam, só de lixo plástico, 4 mil toneladas anuais e só a frota mercante joga nos mares quase 640 mil embalagens de plástico DIARIAMENTE. Mas nem toda essa quantidade absurda se compara ao que é jogado nas praias, por pessoas porcas e mal-educadas que SABEM que estão sujando mas que, dentre outras desculpas, afirmam garantir o emprego dos garis municipais ou então têm preguiça de procurar uma lixeira ou "nojinho" de reter o lixo consigo até encontrar um local apropriado. Existem ainda aqueles que acham que plástico não polui porque – novamente – não tem aparência desagradável ou cheira mal.


E você deve (ou deveria) se perguntar: se todo esse plástico não apodrece e vai para o mar, onde ele está?


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A resposta está em vários lugares, mas a maior – e pior – encontra-se no oceano Pacífico, na altura das coordenadas 38°N 145°W. Oficialmente, esta área é conhecida como giro subtropical do oceano Pacífico norte, mas oceanógrafos, biólogos e navegadores já lhe deram um nome mais apropriado: Grande Mancha de Lixo do Pacífico. Trata-se de um lugar de confluência entre grandes correntes oceânicas, onde quase tudo que bóia pela costa oeste dos EUA chega, espiralando lenta e continuamente na direção de um monstro de lixo que se torna cada vez maior dia após dia. Ali tem de tudo: garrafas pet (e suas tampinhas), redes de pesca de nylon (e seus flutuadores de isopor), plásticos de embalagens de cerveja ou de alimentos em geral, hastes de cotonetes... enfim, todo o lixo que é despejado naquele lado do Pacífico. Todos os números relacionados são assustadores: o monte de lixo tem 2.200km de comprimento por 800km de largura, cobrindo a inacreditável área 1,76 milhão de km². Isto é maior do que toda a área do maior estado brasileiro, o Amazonas (1,57 milhão de km²). A marinha dos EUA calculou que devam existir ali nada menos que 03 milhões de toneladas de plástico, ou 5,1kg/km².
No centro do turbilhão, onde a pressão é maior, a camada de plástico chega a 10m de espessura em alguns locais.


Nesta figura estão marcadas as localizações dos 5 grandes giros oceânicos que se enchem de lixo dia após dia, bem como várias curiosidades a respeito do problema (clique para ampliar).


A mancha se comporta como um organismo vivo, mudando de forma e tamanho ao sabor das correntes marinhas. Contudo, esta nem é a pior notícia! Estes números gigantescos referem-se apenas e tão somente ao plástico VISÍVEL, que bóia na água. Uma quantidade impossível de ser mensurada acaba sendo "colonizada" por algas e cracas que as usam como substrato e que, com seu peso, fazem-na simplesmente afundar. E outra quantidade simplesmente se quebra em partículas tão pequenas que já não podem ser, nem vistas, nem medidas. Em uma estimativa, 35% de todo o lixo da área tem até 1mm de tamanho; 17% apenas 0,5mm e 10% conseguem ter míseros 0,3mm ou seja, apenas 38% de tudo que está lá é visível. E essa parte é quase totalmente composta por sacolas, garrafas (e suas tampinhas) e isopor. Naquela área, em uma proporção por peso, há mais plástico do que plâncton na superfície da água.


Mais precisamente, SEIS vezes mais plástico.


Isso é fichinha quando a mesma experiência é feita em fozes de rios e riachos de Los Angeles, quando tal proporção pode chegar a CEM vezes mais – e aumentando anualmente.


A mancha de lixo do litoral do Japão.
Contudo, não é certo colocar toda a culpa do lixo oceânico nos EUA. Na verdade, todos os oceanos do mundo têm giros similares ao do Pacífico norte, onde tudo que é levado pelas correntes acaba. Na costa do Japão, no mesmo oceano, há outro monte de lixo grande, embora não tanto, e crescendo dia após dia. No total, os oceanos do mundo têm 06 giros tropicais, e todos se enchendo de entulho. Obviamente que o giro do Pacífico norte é maior, afinal recebe todo o entulho flutuante da maior potência industrial do planeta, mas os outros não merecem atenção menor. Quase todo o lixo que chega ao litoral da Suécia provém da Inglaterra; mas os suecos devem se sentir vingados quando sabem que a maior parte do lixo marinho da Irlanda acaba nas praias inglesas.

Se você olhou aquela figura enorme lá em cima, percebeu que existe um giro chamado giro do oceano Atlântico sul. Agora me diga: qual a nação mais industrializada do Atlântico sul? Não é Angola, Gabão, Namíbia ou Camarões... é o Brasil. Sim, nosso país é o principal alimentador do lixo daquele giro. E sabe quem mora aqui? Você. O papelzinho de bala que você joga na rua (e admita, você joga), pequenino, indefeso, vai cair, seja pela chuva ou pelo vento, na rede de pluvial de esgotos, que vai invariavelmente acabar num rio, que sempre deságua no mar.

Água-viva presa em emaranhado de rede de pesca.
Ou mesmo a escovinha de dentes ultrapassada que você joga no lixo do banheiro. Ah sim, tem também o inofensivo fio dental, que você não sabia até agora que é feito de nylon ou do (impronunciável) politetrafluoretileno, que são plásticos. Some a isso todo aquele plástico que você, com toda sua consciência ambiental, separa bonitinho no lixo extra da cozinha. Não pense que, agindo assim, estará fazendo grande coisa não. É um começo, concordo, mas se o sistema de coleta e reciclagem de lixo de sua cidade não for devidamente adequado, todo seu "trabalho" vai adiantar de muito pouco pra não falar quase nada. Isso porque não são todos os tipos de plásticos que podem ser reciclados. A maior parte simplesmente vai pro lixão mesmo.
A mesma coisa essas campanhas de limpeza de praia. É isso mesmo. Elas são mais válidas para afagar nossas próprias consciências do que para de fato ajudar a livrar o mundo desta merda, porque se o plástico recolhido não for devidamente prensado, compactado e armazenado (ou até mesmo cremado), todo ele vai acabar retornando para o oceano.
É foda, pessoal... mas não dá pra ser ambientalmente correto vivendo numa sociedade industrial.


Existe ainda outra característica marcante dos plásticos que os tornam ainda mais terríveis: sua maldita facilidade de flutuar! E, como tudo sempre pode ficar pior, não é apenas o que já está no plástico que causa problemas. Segundo Hideshige Takada, da Universidade de Tóquio, uma gama enorme de toxinas flutuantes vindas dos mais variados tipos de fontes – papel de xerox, graxa automobilística, fluídos refrigerantes, lâmpadas fluorescentes e mais um monte de coisa – caem diretamente em rios que desaguam no mar, e se prendem rapidamente a qualquer resíduo plástico que lhes apareça pela frente. Ou seja, o plástico além de já ser ruim por si só, também age como ímã e/ou esponja para um montão de outros produtos tóxicos, como inseticidas (Aldrin, Dieldrin, Endrin, Mirex, heptacloro e toxafeno), fungicidas (hexaclorobenzeno), pesticidas (clordano e DDT), solventes (furano), lubrificantes (bifenilos) e produtos para clareamento de papel (dioxinas). Ufa! Que merda héin!?


Redes de pesca perdidas ficam vagando a esmo no mar, fazendo
a chamada "pesca fantasma": por não se degradarem, podem
ficar décadas a fio se emaranhando nos mais diversos animais.
Nem mesmo as gigantescas baleias escapam.
Mas tem mais! Até 1970, para deixar o plástico mais maleável era aplicado em sua fórmula o bifenil-policlorado (PCB), que provocava destruição hormonal em peixes e ursos polares, que nasciam com hermafroditismo. Desde aquele ano que a substância foi proibida e nunca mais foi usada, só que tudo que foi produzido até então ainda está na água e vai continuar por lá, excretando PCB no mar e continuando a fazê-lo por séculos e mais séculos.

E infectando todos os seres vivos com os quais tiver contato.  O mesmo professor Takada constatou que as partículas de plástico que os papagaios-do-mar concentram veneno em níveis até 1 MILHÃO de vezes maiores do que sua ocorrência normal na superfície do mar.


E não pense que são apenas as embalagens dos produtos... às vezes, são os próprios produtos! Faça o teste aí em sua casa. Pegue alguma coisa, geralmente de uso feminino, como cremes, cosméticos ou até mesmo a pasta de dentes. Todos eles têm uma coisa em comum: contém esfoliantes em suas fórmulas de composição. Até existem aqueles que são naturais, cujos grãos são de fato compostos por sementes trituradas, seja de uva, damasco, ou até açúcar mascavo e sal marinho, mas os outros... são todos plástico.


É claro que eles não vão colocar PLÁSTICO assim escancaradamente na descrição, mas se você tiver o "trabalho" de ler a descrição do que está comprando vai descobrir que vários dos produtos que você tem (e que são embalados em plástico) contém plástico. Principalmente polietileno. Claro, tudo em letrinhas beeeeem pequenas, quase nanométricas, para justamente te dar preguiça de ler. E isso quando eles têm a descrição. Existem produtos que são vendidos em caixas cuja única função é fazer você abrí-la e jogar fora, e é justamente lá que eles colocam a descrição. Muito espertinhos. Seja como for, todos os produtos de beleza e de limpeza corporal geralmente saem no banho – resumindo: sem ter a menor idéia você está mandando plástico pro ralo, que vai dar na rede de esgoto, que vai acabar... no oceano. No final das contas, novamente, todo esse plástico vai acabar no mar.


Uma pequena seleção que fiz aqui em casa mesmo, juntando produtos de higiene corporal, cosméticos e limpeza doméstica. Da esquerda pra direita:
xampus Johnson's Baby têm estireno e acrilato; esmaltes das marcas Dote Style, Hits e Colorama têm polietileno tereftalato; creme Natura TodoDia Bergamota tem dimetilconol; lenços umedecidos Luppy têm propileno; creme para pentear Dove Proteção Térmica tem dimetilacrilamida e carboxivinil; desodorante Monange tem propileno carbonato, isopropil e dimeticona; condicionador Niely Gold Extra Brilho tem dimeticona e metilanilopropil; condicionador Looney Toones tem dimeticonol; pasta de dente Colgate Smiles tem polietilenoglicol; Nivea Calm & Care tem ciclometicona, dimeticona e dicaprilil; silicone concentrado Niely Gold tem dimeticonol; desodorante Axe tem miristato de isopropilo; tônico equilibrante Higiporo da Davene tem propileno e polietilenoglicol; creme para mãos Avon Basics Luvas de Silicone tem gliceril-estearato e dimeticona; creme hidratante Midnight Mimosa Victoria's Secret tem propileno e dimeticona; loção hidratante Chá Verde Loção Hidratante tem propileno-glicol; creme para penter, Palmolive Kids tem dimeticona; spray facilitador Passe Confort tem acetato de polivinila; pasta de dentes Colgate Total 12 tem éter de polivinilmetila.
Apesar dos nomes complicados, é tudo plástico. E isso tudo são apenas os que eu tenho certeza que são polímeros e/ou que consegui ler nos rótulos diminutos que eles nos concedem - os rótulos de esmaltes, por exemplo, nem com a visão do Super-Homem se consegue ler. Tudo isso aí é plástico, e quase tudo está embalado em mais plástico. Ah sim, o móvel da pia também é todo feito de plástico - bem como tudo que está em cima dele. Nota importante: lá atrás, fazendo pose, está a lupa que eu tive que usar pra conseguir ler algumas descrições (como as dos já citados esmaltes).


Exceto por uma mínima quantidade que é reaproveitada ou incinerada, todo o plástico produzido nos últimos 70 anos, inteiro ou granulado... ainda existe. Está em algum lugar no ambiente.


Plástico encontrado no estômago da carcaça de um único jovem
albatroz-de-Laysan (Phoebastria immutabilis), coletado pela dr.
Cynthia Vanderlip, do Havaí. Link
No oceano, mais exatamente, que é onde acaba todo o plástico que nós jogamos fora, mesmo quando o fazemos no lixo. Agora pense: durante bilhões de anos a geologia do planeta cuida do processo de erosão de montanhas, reduzindo-as à areia, sais dissolvidos e outras partículas tão pequenas que podem ser levadas pelos rios até chegar nos oceanos, onde afundam e se assentam em seu assoalho para formar as próximas montanhas que a tectônica de placas formar num futuro humanamente inalcançável. O Amazonas faz isso com a cordilheira dos Andes a milhões de anos – a ilha de Marajó é quase toda composta por solo trazido dos Andes peruanos. Pois agora outro tipo de sedimento está sendo lançado ao mar pelos rios: plástico.
Se toda a produção mundial de plástico cessasse AGORA, tudo o que já foi produzido fará com que os organismos convivam com isso por um futuro indefinido. Muito mais do que milhares de anos.

Tartarugas também morrem aos milhares nas teias fantasmas...
E esta porcaria, devido a sua elasticidade, versatilidade para flutuar ou afundar, poder ficar "invisível" na água devido à transparência, além de durabilidade e resistência superior a qualquer material natural foram a razão pela qual, por exemplo, os fabricantes de redes de pesca preterissem as fibras naturais pelas sintéticas de plástico, como o nylon e o polietileno: com o tempo, as primeiras se desintegravam natural e inofensivamente; as sintéticas, mesmo quando perdidas por seus donos, continuam no oceano, fazendo "pesca fantasma", fazendo com que todas as espécies marinhas, mesmo as gigantes como a baleia-azul, estejam sempre em risco de ficar presas em emaranhados colossais de redes de pesca perdidos, vagando a esmo pelos oceanos. E isto já acontece com uma desagradabilíssima frequência: albatrozes, focas, tartarugas e golfinhos são sempre encontrados mortos, afogados, presos nestas porcarias resultantes da ação irresponsável de pessoas ignorantes.


Um estudo feito a partir de carcaças de gaivotas jogadas pela maré nas praias do Mar do Norte, na Inglaterra, constatou que havia plástico em 95% dos cadáveres, numa média assustadores de 44 peças para cada ave. Num homem, tal volume estomacal chegaria aos 2,3kg.


Obviamente não dava pra dizer que todas tinha morrido em decorrência do plástico engolido mas, em muitos casos, seus intestinos foram obstruídos pelo volume indigerível, resultando numa constipação fatal.

Se animais grandes como gaivotas e tartarugas estão comendo plástico (e morrendo), e se esse mesmo plástico está se quebrando em partículas menores, é de se considerar que o mesmo acabará entrando na cadeia alimentar de organismos também cada vez menores - especialmente detritívoros e/ou filtradores, como poliquetas e cracas. E quando se tornarem pequenos o suficiente, até o zooplâncton os consumirá.


Agora vocês digam que é "exagero" e "sensacionalismo" aquelas fotos de focas se enforcando em embalagens de cerveja, tartarugas deformadas por rodas de carrinhos de brinquedo, golfinhos afogados em redes perdidas, tartarugas sufocadas por sacos plásticos e gaivotas entupidas de toda sorte de detritos.


Mas uma boa idéia, já que não vamos parar nunca de fabricar plástico, seria a de acrescentar a eles aditivos que os enfraquecessem quando expostos ao sol e seus raios ultravioleta. Isto poderia, por exemplo, salvar a vida de muitos animais marinhos – embora não resolvesse o problema in totum, ao menos o amenizaria.


A merda é que o plástico pode até se fotodegradar, mas isto demora muito mais a acontecer quando o mesmo se encontra justamente na água. Quando em terra, ele absorve o calor das ondas solares infravermelhas e fica mais quente que o ar à sua volta. No mar, ele além de ser naturalmente resfriado pela água, ainda é protegida pela camada de algas e/ou cracas que se fixam nele.


Outro problema é que, mesmo que o plástico se fotodegrade, sua natureza química tóxica não vai mudar por casa disso por centenas, até milhares de anos. Assim, mamíferos e aves marinhas poderiam até ser salvas num primeiro momento, mas os resíduos tóxicos de sua degradação continuariam no oceano, sendo consumidos por organismos menores que seriam por sua vez caçados por outros maiores até chegar... nos mamíferos e aves marinhas. Ou seja, indiretamente, elas ainda seriam vítimas do plástico.


Plástico é sempre plástico. É sempre um polímero. O polietileno não é biodegradável numa escala praticável de tempo. Não existem mecanismos no ambiente marinho capazes de destruir uma molécula tão grande.


... assim como focas, leões-marinhos...
Hoje em dia a produção anual de plástico chega à casa das 180 milhões de toneladas, com uma crescente estimada 9% ao ano em decorrência da expansão de mercados consumidores gigantes, como Índia e China. Estima-se que a quantidade de plástico produzido nos 10 primeiros anos deste século se aproxima da quantidade total produzida em todo o século XX, e a produção total de todos os tempos já supera 1 bilhão de toneladas. Isso inclui centenas e centenas de tipos e subtipos diferentes, muitos com combinações desconhecidas envolvendo aditivos plastificantes, opacificadores, pigmentos, esfoliantes, estabilizadores e outras porcarias para enchimento ou enrijecimento. A durabilidade de cada um varia enormemente, fazendo com que sua longevidade seja simplesmente desconhecida. Até agora, nenhuma variedade desapareceu.


E não se engane quanto às embalagens "biodegradáveis"... isto simplesmente não existe! A grande maioria não passa de uma simples mistura de plástico com celulose. Depois que o amido se quebra, tudo que sobra... é plástico, tão normal quanto o de qualquer outra embalagem.


... e até mesmo crocodilos marinhos!
É verdade que a biotecnologia já está conseguindo produzir uma gama até razoavelmente variada de plásticos verdadeiramente biodegradáveis – viu só? Os biotecnólogos isolados do mundo também conseguem criar coisas boas além de lucrativas. O biopropanodiol, da Dupont, é feito com o açúcar do milho, e já existe também uma série de biopolímeros feitos a partir de bactérias geneticamente modificadas, como o polilactato (PLA), polihidroxialcanoato (PHA), polímeros de amido (PA) e as xantanas (Xan). O biopropanodiol tem a vantagem que os fabricantes mais desejam: economia. Sua produção consome até 40% menos energia do que o plástico convencional. E é apenas e tão somente por causa da oscilação do preço do petróleo (e a possibilidade do fim de seu uso) é que estas novas alternativas apareceram. Ou você acredita que haja realmente alguma preocupação ambiental nisso? Tirando os criadores e produtores do plástico, ninguém se toca de que o mesmo é um derivado do petróleo, e que as reservas do mesmo estão começando a ficar mais escassas e difíceis de encontrar, uma das principais razões pelas quais seu preço também dispara no mercado mundial.


Mas não parece ser muito provável que eles e outros que sejam fabricados seguindo o mesmo princípio substituam o plástico original feito a partir do petróleo. Por exemplo, se a ideia é embalar comida, não parece ser muito inteligente fazê-lo com um material que encoraja as bactérias a comê-lo.


Aqui cabem dois pontos interessantes: 1) parece haver mais empenho em se criar uma bactéria que produza plástico “natural” do que em uma que destrua o plástico artificial; e 2) parar de produzir plástico a partir de hidrocarbonetos é uma alternativa, mas ainda precisamos pensar em todo o plástico já produzido que ainda se encontra no meio-ambiente. Reaproveitá-lo ou ao menos livrar o mundo natural dele, compactando-o em locais específicos para este fim.


Estão percebendo o tamanho da sinuca de bico na qual nos enfiamos? Criamos e passamos a depender totalmente de uma substância absolutamente volátil e poluente, para a qual simplesmente não existe uma forma eficaz de substituição. Talvez seja a hora de começarmos a considerar o plástico como um lixo diferente dos demais, assim como já sabemos que o são as baterias de nossos celulares e as pilhas comuns.


Depois de tudo isso, você pensa: será que algum dia o plástico terá fim?


Leão-marinho estrangulado por rede de nylon.
É bem provável até que sim, mas não numa escala aceitável de tempo. Centenas de milhares de anos, no mínimo. Isso é tempo mais do que suficiente para ocorrer fossilização. Só que não temos a mínima idéia de como um plástico poderia fossilizar-se. Como ele, no início de tudo, é sempre um derivado do petróleo natural, poderia se decompor novamente em hidrocarbonetos que poderiam formar uma gigantesca planície de plástico onde, milhões de anos no futuro, ainda seria perfeitamente possível discernir cabeças de Barbie ou garrafas bojudas de Coca-Cola, ou aglomerados específicos, formados por hastes de cotonetes ou escovas de dente, ou ainda gigantescos montes de nylon das redes de pesca do nosso tempo, gravados nas grandes placas de plástico tal qual moldes de ossos de dinossauros nas rochas do Cretáceo.


Mas um dia, como todo bom hidrocarboneto (= derivado de petróleo), o plástico vai se degradar. O problema é que isto se dará numa escala de tempo tão grande que poucos serão os efeitos práticos se não pararmos de produzí-lo. Todavia, se ele não pode se biodegradar em um período satisfatório, poderá quem sabe fotodegradar num tempo até razoável.

Isto porque, quando hidrocarbonetos se degradam, suas moléculas poliméricas se desmontam nos componentes originalmente combinados para criá-las: dióxido de carbono e água. Mas quando se fotodegradam, a radiação ultravioleta do sol enfraquece a resistência do plástico à tensão, quebrando as moléculas longas e, já que a resistência do plástico depende do comprimento de suas cadeias moleculares, quando os raios UV as quebram, ele finalmente começa a se decompor.


Um exemplo disso são as embalagens que ficam muito tempo em ambiente iluminado pelo sol. Após um tempo, elas começam a amarelar e mesmo a se quebrar sobre si mesmas, quando as tentamos erguer. Geralmente isso acontece com recipientes de polietileno. Os fabricantes sabem disso, e frequentemente adicionam à fórmula do plástico aditivos químicos para torná-lo mais resistente aos raios ultravioleta.


Mas vamos lá, pensemos positivo. Digamos que tudo isso funcionasse perfeitamente, que conseguíssemos encontrar um substituto barato, farto, eficiente e inofensivo (puts, quantas exigências!) e que a humanidade nunca mais produzisse um único nurdle sequer... por quanto tempo nós ou o planeta ainda teria de conviver com o plástico já existente?

Vejam bem, as pirâmides do Egito preservaram por 4 mil anos papel, sementes e até partes humanas, como cabelos, porque foram eficientemente seladas para impedir a entrada de luz solar, além de não renovar o ar (= pouco oxigênio) e praticamente não ter umidade. Nossos depósitos de lixo são similares nesse sentido: o plástico soterrado sobre metros e mais metros de lixo se encontram em condições semelhantes, e assim, vão permanecer por muitos e muitos milhares de anos. Outro ambiente bastante parecido é o fundo do mar. Se todo o plástico que afunda é recoberto por sedimentação e está num ambiente sem luz e com pouquíssimo oxigênio, além de extremamente frio, pode ficar lá para sempre.


Este tipo de atitude é extremamente válido, mas se não houver o
devido cuidado após o recolhimento, ano que vem eles estarão
recolhendo exatamente as mesmas peças de plástico.
Entrementes, temos de considerar que ainda não conhecemos satisfatoriamente a microbiologia das regiões oceânicas abissais. É perfeitamente possível que existam por lá bactérias anaeróbias capazes de destruir plástico. Não é impossível, mas altamente improvável, e ninguém nunca conseguiu nenhuma evidência a respeito até hoje. Ainda assim, espera-se uma degradação muito, muito mais lenta no fundo do mar do que na superfície da terra.

Levou muuuuuito tempo para que os micróbios aprendessem a quebrar hidrocarbonetos naturais em suas partes componentes, quando apareceram as primeiras plantas capazes de produzir lignina e celulose. E olha que, molecularmente falando, a lignina é bem mais complexa do que o plástico. Mais recentemente, elas aprenderam até a comer óleo. Mas agora elas têm de lidar com hidrocarbonetos artificiais, aditivados por outras substâncias igualmente artificiais e além de tudo tóxicas, e convenhamos, 70 anos é muito pouco para que desenvolvam o aparato bioquímico necessário para atingirem esse objetivo.


Mas, mesmo que não façamos idéia de quando, um dia mesmo o plástico mais resistente... desaparecerá. Mesmo que os microorganismos jamais consigam degradá-lo, não esqueçamos que, além do tempo biológico, também temos o tempo geológico. Mesmo todo o plástico flutuante uma hora acabará recoberto por algas, cracas ou colônias bacterianas que o farão afundar. A tectônica de placas invariavelmente os levará a camadas mais profundas, onde as alterações de relevo e pressão acabarão transformando-o em outra coisa. As gigantescas florestas do Carbonífero passaram por esse processo, e é graças a ele que hoje temos carvão e petróleo. Foi a geologia, e não a biologia, que fizeram-nas passar por esta transformação. É até mesmo possível que, com o tempo geológico correto, nenhum indício de plástico sequer sobre para contar a história.


Será que, no fim, não será nossa inteligência, mas sim a biologia e a geologia que resolverão o problema? É esperar pra ver.



Também retirei MUITO (e excelente) material do fabuloso livro O Mundo sem Nós (Ed. Planeta do Brasil, 2007), de Alan Weisman.