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segunda-feira, 30 de abril de 2012

Os Invasores


Não é ao grupo da Marvel que me refiro...

Aproveitando o sucesso de Os Vingadores (e também porque sou fã irrecuperável da Marvel Comics), coloquei como imagem de abertura uma figura dos Invasores, primeiro super-grupo daquela editora. Mas ao contrário destes, os invasores dos quais vou tratar aqui não têm nada de heróicos ou benevolentes. Pelo contrário, são uma ameaça ao planeta! Ao longo do artigo, você conhecerá vários deles e onde estão causando problemas.

Você já viu aqui neste blog diversos exemplos de cagadas que a humanidade (incluindo você) fez, faz e sempre vai fazer no mundo. E, pra não fugir à linha, agora vai ver mais uma – que assim como as outras, também é um tanto sutil e inconveniente, porque praticamente ninguém fora do meio científico (e mesmo muitos dentro dele) se toca da mesma: a bioinvasão.

Segundo James T. Carlton, professor de ciências marinhas do Williams College, de Massachussets (EUA), por este termo entende-se a chegada, estabelecimento e expansão de uma espécie exótica em um local que não é seu habitat natural historicamente conhecido, resultante de dispersão acidental ou intencional por atividade humana (pra variar).

E por que ninguém sabe deste assunto? Por dois motivos: o primeiro é o total desinteresse do público mesmo; o outro é que tendemos a combater apenas animais que nos causem problemas de forma direta (como cupins, mosquitos e pragas agrícolas), ou então que sejam visualmente repulsivos (como ratos e baratas). E isto quando não exterminamos espécies que não nos causam absolutamente nada – ao contrário, nos ajudariam a combater justamente as que são nocivas. Neste quesito podemos colocar cobras, sapos, aranhas e escorpiões nativos.

Sapo cururu (Bufo marinus), tocando o terror na Austrália.
E existem ainda aquelas criaturas que nem imaginaríamos que não deveriam estar por aqui. Seu cachorrinho, por exemplo, não deveria existir. Ao menos, não no Brasil. Tudo bem, ele não é exatamente nocivo (embora transmita raiva e sarna, dentre outras) mas é descendente do lobo cinzento (como você já deve ter visto AQUI) e foi trazido pra cá pelos europeus. Idem aos gatos, que não são nocivos para nós especificamente, mas fazem o terror de nossos belos passarinhos (as menores estimativas calculam em 80 MILHÕES o número de pássaros mortos anualmente em todo o mundo por nossos gatos). O mesmo com relação a bois, cavalos e galinhas... tudo isso veio da Europa. Originalmente, não deveriam estar aqui, o mesmo acontecendo com várias espécies de invertebrados e até de plantas (ver mais adiante).

O maior aliado da maioria destas espécies é justamente o desconhecimento que temos das mesmas, o que passa uma falsa ideia de que não sejam prejudiciais. Temos muito nojo de insetos e roedores em virtude dos prejuízos diretos (financeiros ou de saúde) que os mesmos nos causam, mas não nos importamos sequer sabemos! quando essas espécies se tornam devastadoras para outras formas de vida. Mas para ilustrar melhor isto tudo, nada melhor do que alguns exemplos práticos. Vamos a eles.

Ooooh... não é lindinho? NÃO!
Todo mundo acha o pardal (Passer domesticus) uma doçura de criatura, passarinho fofinho e bonitinho que não incomoda ninguém... ledo engano. Essa desgraça originária do Oriente Médio talvez seja hoje o maior invasor do mundo e a 2ª ave mais comum do planeta, perdendo apenas para a galinha doméstica. Começou a se dispersar através da Europa e Ásia, chegando na América por volta de 1850. Aqui no Brasil, apareceu em 1903, quando o então prefeito do Rio de Janeiro, Francisco Pereira Passos, autorizou a soltura de 200 exemplares importados de Portugal para "ajudar no combate a insetos nocivos". Hoje, a presença desta ave é garantida em quase todos os países do mundo. Embora prefira áreas urbanas, em nosso país até na Amazônia e no Atol das Rocas, 230km oceano adentro, o malditinho já apareceu.

Mas qual o problema com ele? Pra nós, até que poucos.
Mas para a natureza...

Trazido para ajudar a combater insetos, ele de fato até o faz, convenhamos. Só que, assim como o rato, é capaz de comer qualquer coisa inclusive grãos comestíveis para nós. Arroz, milho, frutas, verduras... nada escapa ao seu apetite, é um tremendo de um glutão! Além disso, ele afugenta os úteis passarinhos insectívoros originais, como o tico-tico, a corruíra, a tesourinha e até o anu e o simpático bem-te-vi, bem maiores que o pardal. Isto por si só já seria o bastante, se o "coiso" ainda por cima não utilizasse os mesmos locais que nossos passarinhos para fazer seus ninhos. Isto quando não os expulsa de seus próprios (existem relatos de pardais afugentando até joões-de-barro de suas casas). Ou seja, ele está reduzindo nossa população nativa de pássaros, eliminando competidores por comida... e se tornando cada vez mais numeroso.

Aliás, pássaros de uma forma geral são poupados de culpa quando se trata de apontar bioinvasores. Inclusive o comércio deles é totalmente livre (se duvida, digite passaros exoticos a venda no Google e se prepare para a enxurrada de sites que comercializam pássaros estrangeiros). Isto porque nenhum deles traz malefícios notórios para a população em geral e são criaturas visualmente amáveis e sonoramente encantadoras. Por exemplo, quem é que acha o bico-de-lacre ou o diamante-de-goudi bichos desagradáveis? Pois é, mas eles também são exóticos e não deveriam estar no Brasil. Só que tem uma ave cuja (má) fama é bem conhecida: o pombo (Columba livia).

Símbolo da paz... e sujo pra car@L#$% !!!
Esse inveterado fazedor de cocô é outra presença obrigatória em nossas grandes (e médias e pequenas e micro) cidades. E pra variar, também veio da Europa. Só que é ainda mais antigo que seu amiguinho pardal: está por aqui desde o Séc. XVI, quando chegou junto com os portugueses nas caravelas, e se espalhou por tudo. O ajuda muito o fato de ser associado à paz e por ser a "imagem de Deus descendo sobre Jesus em seu batismo", o que lhe deu uma aura de intocabilidade durante séculos a fio.
Contudo, esse animal vem merecendo uma atenção mais especial, principalmente das autoridades de saúde, por causa de suas fezes que, além de serem as vetoras de uma série de doenças, são assustadoramente ácidas, com poder corrosivo suficiente para destruir até aço. Imagine então o que faz com esculturas de bronze, ou lataria de carro. Uma das possíveis soluções para contê-lo é o Ornitrol, um milho revestido por uma camada quimioesterilizante, que pode ser jogado nas praças onde se concentram. Isso ajudaria a reduzir a fecundidade dos animais mas faria o mesmo com outros pássaros. E agora?

Ratazana de esgoto.
Mas quando se fala em bicho repulsivo, provavelmente o primeiro animal que vem à sua cabeça é o rato doméstico (Rattus norvegicus). Também pudera: a criança vive no lixo e no esgoto, e tem nada menos que 35 doenças associadas, muitas das quais promoveram verdadeiros episódios de extermínio em massa na humanidade, como a Peste Negra do Séc. XIV. Ainda hoje, mesmo com todas as condições sanitárias e medidas profiláticas, não há como manter-se muito longe de um rato, esteja você onde estiver. Ele é talvez o animal mais troficamente generalista que existe: pode comer absolutamente de tudo, desde grãos, passando por ossos até papel e fios elétricos.
Por que este roedor se tornou o que ele é hoje? Pelos mesmos motivos de 660 anos atrás: ajuda humana. Nossas cidades são o Éden para eles... lugares pequenos, escuros e apertados, fartura de lixo e suprema falta de predadores
ou você vê muitas cobras, corujas e mesmo gatos pelas ruas? Pois é... a peste bubônica só não toma novamente proporções continentais porque hoje em dia temos vacina, saúde pública (no nosso caso aos pandarecos, mas temos) e medidas de combate ao roedor. Mas a relação rato / homem já é praticamente um parasitismo, e o primeiro talvez só desapareça da face da Terra se o segundo sumir antes.
Talvez mais do que em qualquer outro caso, o rato doméstico traz, com sua péssima fama, muitos problemas para outros roedores que nada têm a ver com a história. Existem mais de 700 espécies de ratos, das quais apenas ele nos causa transtorno. Todavia, as diferenças são tão pequenas que matamos todo e qualquer animal meramente parecido com um rato hamsters, lemingues, jerboas, camundongos e até mesmo gambás acabam pagando o pato por serem "parecidos".

E não são apenas os animais... um montão de espécies de plantas também entram nessa lista. Se você está tomando café agora, saiba que é uma espécie exótica. Se estiver saboreando uma bela limonada ou um caldo de cana geladinho também. E não se engane quanto à imobilidade ou suposta impotência de uma planta. Na verdade, algumas delas podem ser tão destruidoras quanto os bichinhos.

Ou até mais. A segunda espécie invasora mais perigosa de todas... é uma árvore: a acácia (Acacia cyanophylla).

Quem diria, não? Esta inocente arvorezinha é o 2º organismo invasor mais devastador e perigoso da face da Terra.


Essa árvore foi trazida da Austrália para fins de ornamentação no mundo todo. Depois "descobriram" que ela também era ótima para recuperar matas às margens de rios... tudo errado! A mardita destruiu tudo por onde passou. Sua capacidade de captar azoto atmosférico e dispersá-lo no solo provoca mudanças na composição biótica do mesmo, com efeitos devastadores para as espécies vegetais nativas. Suas raízes também destroem calçadas, pavimentos e tubulações subterrâneas. Além de tudo é extremamente resistente, nem queimando ela morre (tampouco suas sementes). Só pode ser exterminada com herbicidas muito poderosos, que arrasam todas as plantas em seu entorno. Na Cidade do Cabo, África do Sul, onde é uma verdadeira praga urbana, a introdução de um fungo (Uromycladium tepperianum) mostrou-se eficaz, eliminando 80% das árvores daquela cidade. Mas ainda não se sabem que efeitos esse mesmo fungo pode ter em outras espécies vegetais.

O eucalipto (Eucalyptus sp.) é outra porcaria de árvore que jamais deveria ter aparecido por aqui. Originário da Austrália, foi trazido para cá no Séc. XIX para a indústria madeireira. Postes, pontes, dormentes de ferrovias, cercas, móveis, carvão... sua madeira é extremamente adaptável.
Só que, infelizmente, o eucalipto é muito mais. É uma árvore que apresenta uma das mais altas taxas de transpiração entre todas. E isto exige grande quantidade de água
que ele vai retirar de onde estiver. Na Austrália, que é quase toda formada por savana e deserto, ele tinha que se virar, mas quando chegou aqui e encontrou esse paraíso tropical de água doce, o eucalipto tocou o foda-se geral.

Só ele gosta de eucalipto...
Isso porque cada exemplar consome, em média, 30 litros de água por dia. Agora imagine uma plantação "de reflorestamento" com milhares deles. Em todo lugar onde é plantado, o eucalipto arrasa os recursos hídricos. Um exemplo é a região norte do Espírito Santo, onde mais de 130 córregos foram totalmente secos depois que a árvore foi introduzida lá. Além de secar cursos d'água menores, provoca o assoreamento de rios, e a falta dessa água afeta não apenas os animais que bebem dela, mas também as plantas nativas e culturas agrícolas por vezes até bem longe de onde os eucaliptos estão, deixando bastante evidente que a perda de produtividade da terra talvez não compense os ganhos com o comércio da madeira da árvore.
Quando ela é plantada em locais com baixa oferta d'água, parece que se enfurece ainda mais e procura o líquido com ainda mais força, com resultados terríveis: ressecamento de olhos d'água e até de poços artesianos, podendo inclusive aprofundar o próprio lençol freático. É tanta, mas tanta coisa ruim que não dá pra colocar tudo aqui. Esse artigo vai trazer-lhes muito mais (péssimas) informações.


Mas por que, apesar de todos esses malefícios que são conhecidos, ele continua sendo plantado? Dinheiro, oras bolas. A Aracruz Celulose S/A é a maior produtora de celulose de eucalipto do mundo, e cerca de 95% de sua produção é destinada à exportação, gerando lucros colossais. Empresas de reflorestamento devastam extensões gigantescas de floresta nativa e rapidamente entopem a área com eucalipto ou pinheiro, que crescem rápido, são grandes e frondosos e em poucos anos deixam a área coberta de verde novamente. É claro, então, que o setor sempre vai defender o eucalipto. E pode até ter lá sua dose de razão, mas isso não exclui o fato de que a árvore é exótica e não deveria estar em nossas terras.

Uma das piores características de monoculturas como as do eucalipto ou do pinheiro é um efeito colateral conhecido como "deserto verde". Trata-se de uma área sem biodiversidade alguma, tomada por uma única espécie de planta que não dá chance a nenhuma outra de se estabelecer. São, portanto, desertos de vida. Os defensores da ideia enchem a internet e o debate com fotos de monoculturas cheias de outras plantas, tentando fazer cair o mito do deserto verde mas conveninentemente não mencionam que as plantas em questão não passam de mato, capim e outras espécies extremamente oportunistas, conhecidas como ruderais. Além disso, também alegam implementar amplas medidas socioambientais e de preservação, além do infalível argumento da geração de empregos... tudo mentira. Monoculturas como essas, controladas por corporações gigantescas, são quase 100% mecanizadas, não necessitando de mais do que meia-dúzia de funcionários para manufaturar tudo. Na época em que estava buscando financiamento, a Aracruz afirmava que cada hectare de plantação de eucalipto geraria em média 04 empregos diretos. Fazendo as contas, seus 247 mil hectares gerariam então 988 mil empregos, um sonho para qualquer investidor! No entanto, segundo dados de 2004 gerou apenas 02 mil 986 mil a menos do que havia prometido.

Um bom exemplo de "deserto verde" é esta plantação de eucaliptos do Grupo Suzano, no Piauí. Biodiversidade zero e empregos próximos a isso em contrapartida aos arrasadores lucros da empresa e aos imensos prejuízos sociais e ambientais.

Dei destaque à acácia e ao eucalipto, mas existem dezenas de outras espécies de plantas exóticas no Brasil. Vá até seu jardim ou à pracinha da esquina e dê uma boa olhada. Beijinho, jambolão, bisnagueira, mangueira, caquizeiro, limoeiro e laranjeira... tudo isso é exótico. Se bobear, nada que existe em seu jardim ou em seus vasinhos em cima da mesa da cozinha são nativos daqui.

Toda espécie invasora possui uma vantagem competitiva com relação àquelas que acabam destruindo, chamada generalismo: capacidade de, literalmente, se virar, consumindo qualquer  alimento disponível e se adaptando à quaisquer condições ambientais.

Mas embora destruam o meio-ambiente, elas não o fazem por serem realmente malvadas, não que queiram instintivamente devastar tudo (ao contrário de alguns filhas-da-puta da bancada ruralista do nosso sempre infeliz Congresso Nacional)... elas estão apenas e tão somente seguindo as mesmas leis da evolução que todas as espécies seguem, e não apareceram aqui sozinhas, foram trazidas. Só que se deram tão bem, mas tão bem que, hoje em dia, é quase consenso que algumas delas (como o já citado pardal) se tornaram simplesmente "inextermináveis".

Falcões-peregrinos são predadores naturais dos
pombos, e podem ser uma boa alternativa. Mas

não darão conta sozinhos.
A questão não é nada simples, e carrega muita polêmica: o mais correto seria promover uma forma de eliminar todas essas espécies nos locais onde as mesmas não deveriam existir. Muitos podem até me contextar como biólogo que sou, mas é exatamente por isso que defendo tal idéia.
Contudo, também defendo que podemos fazer algo mais inteligente do que sair destruindo-os a esmo, até porque, como já disse, não é culpa deles terem sido levados pra fora de seu habitat original. A culpa por estarem onde não deveriam estragando o que não poderiam é exclusivamente nossa. Existem várias alternativas, e todas com seus prós e contras. Uma delas seria dificultar ao máximo a reprodução de tais espécies. Para aves como o pardal, por exemplo, bastaria tapar os beirais dos telhados para evitar que nidificassem. Se o tentassem em ambiente selvagem, seriam mais facilmente controlados por cobras, gambás e gaviões.
Ainda aproveitando nossos predadores nativos, poderíamos aumentar seu numerário (de forma controlada, por favor!) para que pudessem caçar os invasores. Já para árvores e plantas, seria o simples caso de parar de plantá-las ou mesmo cortá-las, trocando-as por espécies originais. Ideal não é, mas...

Mas são medidas, se não fáceis, extremamente caras, e seu êxito é extremamente duvidoso. Além do que, existem árvores exóticas centenárias, até mesmo históricas e que, com a atual onda de derrubada de árvores em nossas cidades, dificilmente teriam seu corte bem aceito pela sociedade. Um exemplo são as magníficas palmeiras imperiais do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, originárias das ilhas Maurício, 10 mil km a leste. Qualquer um que atreva-se sequer a falar em cortar aquilo vai ser no mínimo excomungado!

Infestação de coelhos na ilha Macquarie: sequência de erros
HUMANOS que culminaram em uma catástrofe ecológica.
E o controle de pragas e espécies exóticas nem sempre traz bons resultados... um exemplo recente foi o da ilha Macquarie, da Austrália. A história daquilo ali é a seguinte:No Séc. XVIII, caçadores de focas exterminaram toda a população destes animais e introduziram camundongos e ratos (acidentalmente). Sem predadores, a população de roedores explodiu e se tornou insustentável, fazendo com que alguém tivesse a "brilhante" idéia de espalhar gatos pela ilha. Também despejaram coelhos (propositalmente), para que servissem como fonte de carne para possíveis náufragos futuros. Isto por si só já arrasou com a cobertura vegetal do lugar. Em 1968 a população de coelhos, mesmo com os gatos, ultrapassou os 100 mil numa ilha com apenas 40km de comprimento. O governo australiano introduziu então um vírus mortífero chamado myxoma entre os animais, que perderam 80% de seu numerário. Só que por conta disso, os gatos, que estavam acostumados a comer grandes e gordos coelhos, ficaram com mais fome e passaram a caçar as aves nativas da ilha, na razão de até 60 mil por ano, ameaçando seriamente tais espécies. Aí o governo decidiu que havia chegado a vez dos gatos e, em 1985, iniciou um programa de matança sistemática, até que em 2000 o último gato foi eliminado. Sem predadores, adivinha o que aconteceu com a população de coelhos...?
Pois é, os que sobraram sobreviveram à seleção natural causada pelo vírus, tornaram-se imunes e sua população explodiu, destruindo 40% de toda a vegetação nativa. Num episódio, eles destruíram tanto a vegetação numa encosta que esta desabou, soterrando uma colônia inteira de pinguins que estavam lá embaixo. Em um efeito conhecido como "cascata trófica", a ilha foi arrasada.
Agora eles vão mexer na ilha de novo! Vão tentar consertar toda a caca e restaurar a composição original da ilha. Pode vir a dar certo ou não (mais provável que não, aliás) e vai custar muuuuuuito caro... é só um exemplo de como recuperar um ambiente infestado por espécies invasoras é extremamente difícil.


Além do mais, se fôssemos realmente limpar a biosfera de todos os organismos invasores que já espalhamos pelo mundo, esbarraríamos na mais invasora e prejudicial de todas as espécies do planeta: a nossa.

Lembra-se lá em cima quando disse que a acácia era a 2ª maior ameaça do planeta? É porque nem todas elas unidas e multiplicadas se comparam à humanidade quando se trata de destruir, devastar e arrasar o meio-ambiente. Tem sido assim desde a pré-história e vai continuar, enquanto estivermos neste planeta.

Para nossa grande e eterna vergonha.


Ave entupida de óleo durante o episódio do vazamento da British Petroleum, no Golfo do México, em 2010. Clique na imagem para ver mais fotos horríveis do evento.

Conhecedores do assunto certamente sentirão a falta de invasores famosos, como a tilápia, o caramujo africano, o molusco zebrado ou a abelha africana. Estas e muitas outras criaturinhas indesejadas podem ser encontrados fuçando nos links sugeridos abaixo:

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O Desastre do Mar de Aral

Não, os barcos não são de brinquedo. Isto tudo já foi água além de onde a vista alcança.

O Mar de Aral já foi o 4º maior lago do planeta, com área de 68.000km² (quase do tamanho da Irlanda) e 1.100 km³ de volume de água. Ele e seu companheiro mais próximo e maior, o Mar Cáspio, são "restos" geológicos de um grande mar interior que dominava a paisagem russa milhões de anos antes e que retraiu-se, deixando-os como lembrança de sua passagem. Seu nome significa mar das ilhas e está (ou estava, dependendo do contexto) situado no que hoje é a divisa do Uzbequistão com o Cazaquistão, mas a triste história de seu fim tem origem quando estes dois países ainda eram parte da grande  URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

Tudo começou quando os soviéticos declararam como kolkhoses (zonas agrícolas coletivas) as estepes da Ásia central. Como parte do plano, tiveram a "brilhante" ideia de desviar Amu Darya e Sir Darya, os 02 rios que alimentavam o lago, para irrigar as plantações de algodão e cereais diversos.
Já repararam nisso? O homem tem que ver "motivos econômicos" para um lugar ou ser vivo. Não importa que eles simplesmente sejam importantes apenas por existir ou pelo valor de sua própria vida,  precisam nos dar lucro. Se não, não têm serventia. Isto inclusive me foi ensinado na própria universidade: ao se propôr uma área ambiental protegida, se faz necessário mostrar sua "importância econômica", a fim de que haja real interesse em se preservá-la.


Pilha de algodão no Uzbequistão. O progresso inicial "escondeu"
a maior catástrofe ambiental da história da humanidade.

Mas voltemos ao Mar de Aral. Verdade seja dita, a cultura algodoeira prosperou. Essa parte do plano deu certo, e o Uzbequistão se tornou o 3º maior produtor mundial da fibra. O desaparecimento do lago não foi nenhuma surpresa para os soviéticos, e inclusive esperava-se que acontecesse muito antes. No início de 1964, Aleksandr Asarin, do Hydroproject Institute, afirmara: "era parte do plano (...) aprovado pelo Conselho de Ministros e pelo Politburo. Ninguém em um nível inferior se atreveria a dizer uma palavra os contradizendo, mesmo que significasse o destino do Mar de Aral". Assim, eles convenientemente "não se deram conta" (aham!) de que o desvio dos rios, a vasão d'água e a construção dos canais foram extremamente mal calculados. O maior canal, chamado Qaraqum, perdeu entre 30% e 75% de toda a água que desviou. Mesmo hoje, apenas 12% do comprimento total do canal de irrigação do Uzbequistão é impermeabilizado. A maior parte da água evaporava ou vazava antes de chegar às plantações, mas a prioridade dos soviéticos sempre foi manter o comércio de algodão, arroz e outros cereais em detrimento de qualquer outra coisa.

Na década de 60 o nível do lago baixava, em média, 20cm anuais; nos anos 70, aumentou para 50cm e, nos anos 80, absurdos 90cm! Em 1987 o lago se dividiu em dois: Aral Norte e Aral Sul.

Progresso da desertificação do lago.

Em 1991, o Uzbequistão conquistou sua independência, assim como várias outras ex-repúblicas após o colapso da União Soviética. Mas manteve-se nos mesmos erros de seus predecessores: os agricultores não se valeram da rotação de culturas e empobreceram o solo de tal forma que tiveram de entupí-lo com quantidades assombrosas de pesticidas e fertilizantes. O solo ao redor é insuportavelmente poluído e as pessoas que vivem na área sofrem com a falta de água potável e problemas de saúde, incluindo as altas taxas de câncer, doenças pulmonares (incluindo a tuberculose), transtornos digestivos, anemia e infecções, além de problemas nos rins, fígado e olhos. Os problemas de saúde gerados pela poluição do lugar estão associados com a alta taxa de mortalidade (75 em cada 1.000 recém-nascidos e 12 em cada 1.000 mulheres durante o parto). Culturas agrícolas na região são destruídas pelo sal sobre a terra.

O lago secava a olhos vistos e no verão de 2003 a parte sul foi dividida em bacias ocidental e oriental. Em 2004, a salinidade original havia quintuplicado, aniquilando quase toda a flora e fauna naturais que ainda resistiam. Em 2007 90% de sua área original já estava perdida, e o Aral Sul começou a ceder lugar para o Aralkum, um deserto de sal que está se formando no que era antes o leito do lago. Quanto à água que ainda resta ali, a salinidade aumentou para níveis superiores a inacreditáveis 100g / litro só para efeito de comparação, a concentração de sal na água do mar é de 35g / litro.

Bóia de sinalização. O Mar de Aral já teve quase 70 metros
de profundidade. Hoje, sua parte mais profunda mal chega aos 30.

O ecossistema do Mar de Aral e os deltas de rios que o alimentavam foram destruídos, e o recuo das águas deixou enormes planícies estéreis cobertas de sal envolto em produtos químicos tóxicos resultado de testes bélicos (havia um laboratório secreto de armas biológicas em Vozrozhdeniya, uma de suas ilhas), dejetos industriais, pesticidas e escoamento de fertilizantes que tornam impensável o consumo da pouca água que ainda resta nas adjacências.  Até mesmo o ar que sopra na região é venenoso, pois as vastas planícies de sal exposto, aliadas ao vento e à falta da água que as continham,  produzem nuvens de poeira tóxica que se espalham pela região.

A outrora rica natureza às margens do lago foi devastada – das 173 espécies que habitavam suas margens apenas 38 conseguiram resistir. Apesar de sua fauna de peixes sempre ter sido muito pobre em variedade, com pouco mais de 20 espécies, o estoque era tão abundante que a indústria pesqueira do Mar de Aral era responsável por 1/6 de todo a produção da URSS e empregava 40.000 pessoas. Com o secamento do lago a atividade acabou, gerando enormes dificuldades para a população local. A cidade de Mo'ynok, ao sul no Uzbequistão, possuía um movimentado porto pesqueiro que agora é um gigantesco cemitério de navios enferrujados a muitos quilômetros da atual costa do lago.

Todos esses peixes um dia existiram no Mar de Aral. Hoje, apenas o linguado Platichthys flesus (que não é nativo) ainda resiste.

Como se não bastasse o desaparecimento da água, os peixes do local sofreram com a invasão de espécies introduzidas. Este problema (mais um...) iniciou-se em 1957 com introduções acidentais e "planejadas" no Mar de Aral. Mais de 20 espécies de peixes foram introduzidas e a maioria deles se estabeleceu muito bem. Atualmente, todos (à exceção do linguado Plathichtys flesus) foram eliminados. A 2ª crise dos peixes nativos começou em 1971, quando a salinidade da água aumentou acima de 14g / litro e mais uma leva de espécies desapareceu. A terceira ocorreu em 1986, quando a salinidade excedeu 25​​g / litro, e dessa vez todas as espécies de água salobra foram extintas. Em 1989, quando a seca dividiu o lago em 02 partes, apenas 07 espécies de peixes (nenhuma nativa), 10 de zooplâncton e 11 de organismos bênticos permaneceram. TODAS as espécies de peixes originais do lago foram exterminadas. Como dito anteriormente, hoje o único que consegue viver no lago é aquele linguado. Introduzido. E ainda assim cada vez mais raro.

Mas como dito antes, a economia da região entrou em colapso com o desaparecimento da água, que também alterou o clima local: a temperatura média subiu 1,5ºC, provocando verões ainda mais quentes e secos – e invernos mais frios e demorados. E, como num círculo vicioso, a temperatura elevada faz as plantações do entorno necessitarem de mais água, que vai sair de onde? Do Mar de Aral...
Mas não, não para por aí! As plantações alteraram seus ciclos com a mudança climática local, diminuindo a própria produtividade. Ou seja: tira-se ainda mais água para produzir-se cada vez menos.

Outra espécie que foi extinta na região foi o rato
almiscarado (Ondatra zibethicus), que vivia nos
deltas dos rios que desaguavam no lago e fôra
caçado na ordem de 0,5 milhão por ano para
fazer casacos de pele.


Como alento, o Aral Norte tem recebido alguma atenção e cuidado. Em 1992 foi fundada a Comissão Interestadual de Coordenação da Água da Ásia Central (ICWC) formada por 05 países da Ásia Central próxima ao lago na esperança de resolver os problemas ambientais e sócio-econômicos na região do Mar de Aral.
Como resultado, em 1993 foi criado o IFAS (Fundo Internacional para o Mar de Aral) para arrecadar fundos para os projetos na bacia do lago. O programa até apresenta algum resultado positivo, mas esbarra na burocracia e na demora de sua aplicação, retardando assim seus progressos.
Em 1994 os governos do Cazaquistão, Uzbequistão, Turcomenistão, Tajiquistão e Quirguistão assinaram um acordo para garantir que 1% dos seus orçamentos fossem destinados a projetos de recuperação do Mar de Aral.
Em 2000 a UNESCO apresentou um trabalho chamado Visões Relacionadas à Água da Bacia do Mar de Aral para o Ano de 2025 no II Fórum Mundial da Água, em Haia, Holanda. Mas o documento foi criticado por estabelecer metas por demais espetaculares, e também por não dar atenção suficiente aos interesses da área outrora às margens do lago.
Em 2006 os projetos de restauração do Banco Mundial, especialmente no Aral do Norte, deram algum resultado: a construção da barragem de Kokaral separando as duas partes do lago fez com que o nível do Aral Norte subisse 12m em 05 anos, ao mesmo tempo em que a salinidade diminuía. Os peixes retornaram, e seu estoque chegou a um nível em que a pesca comercial pode voltar a ser pensada.

Guarde os logotipos bonitinhos e seus nomes: Uzbekneftegaz, Korean National Oil Corporation, China National Petroleum Corporation, LUKoil Overseas e Petroliam Nasional Berhad. São estas companhias que vão terminar de destruir o Mar de Aral.


Contudo o Aral Sul, que fica na parte mais pobre do Uzbequistão, foi abandonado à própria sorte. Existem projetos que poderiam ajudar, mas o governo do Uzbequistão não mostra nenhum interesse em abandonar o rio Amu Darya como fonte de irrigação do algodão, e faz ainda pior: Ergash Shaismatov, o Vice-Primeiro-Ministro uzbeque, anunciou em 2006 que o governo e um consórcio internacional reunindo a estatal Uzbekneftegaz e também empresas de Rússia, Malásia, Coréia do Sul e China assinaram um tratado de partilha para construir e explorar campos de petróleo e gás no leito do Aral Sul. Em 2010 já eram extraídos 500.000m³ de gás diretamente do leito seco do lago.

Vice-Primeiro-Ministro uzbeque, Ergash Shaismatov, ao lado
do Vice-
Primeiro-Ministro da China, Li Keqiang, em 2009: "O
Mar de Aral (...) promete em termos de petróleo e gás. Existe
um risco, mas acreditamos no sucesso deste projeto único".

Ou seja: de fato não há interesse na recuperação do Mar de Aral. A merda foi tão grande que se tornou  praticamente irreversível. O que aconteceu ali é considerado o maior desastre ambiental de todos os tempos, a primeira grande modificação humana possível de ser plenamente vista do espaço.

E não pense o(a) leitor(a) que este foi um caso isolado! No Iraque a drenagem dos pântanos da Mesopotâmia também resultou numa catástrofe ambiental; mesma coisa com os lagos da Bacia de Sistan, entre Irã e Afeganistão; na África, o Lago Chade também já está quase seco por causa de projetos de irrigação na Nigéria e no Chade; o Mar Morto, em Israel, está secando em virtude do desvio da água do rio Jordão ao sul; mesma coisa com os lagos Tulare e Mar Salton, nos EUA... No Brasil, temos a ameaça de Belo Monte que não é um projeto de drenagem mas também vai afetar horrorosamente o ciclo de escoamento da água do rio Xingu, no Mato Grosso.


Quero terminar deixando estas palavras, para pensar:

O homem já revolveu mais terra e rocha do que qualquer outro evento geológico em toda a história da Terra.Todos os anos, uma área de floresta quase do tamanho da Escócia é varrida do planeta. Ou seja, além de estarmos sufocando o mundo com dióxido de carbono, estamos lhe minando a capacidade de resolver o problema.
Contudo, a Terra é muito resistente. Uma floresta pode ser totalmente devastada, mas se recupera em alguns milhares de anos.
O mundo, a longo prazo, vai ficar bem... a humanidade, não.

Não é o planeta que está em perigo. Somos nós.



Para saber mais:

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Você morreu... fodeu!



Ok, vocês venceram. Hoje não vou falar de religião.

Não por falta de assunto, mas porque não é apenas neste campo que existem coisas erradas e prejudiciais acontecendo que precisam ser resolvidas. Maaaaaaaaaaaaassss... o que vou escrever hoje também tem a ver com ela.

Não é perseguição! Não tenho culpa se ela estraga qualquer coisa na qual se mete!

Mas o assunto não chega exatamente a ser inédito. Já escrevi em outras postagens o quanto a espécie humana é desprezível e insignificante. Ela se transformou numa criatura tão ruim que nem mesmo MORTA deixa de ser um problema. O homem é o único animal que dispende um tratamento especial a seus mortos – já vem fazendo isso desde a época dos neandertais – e isso gera um problema imenso PARA OS VIVOS.

Por quê? No caso do enterro, que é o principal destino dos mortos humanos mundo afora, por três fatores, a saber: acúmulo de corpos, proximidade de recursos hídricos e excesso de químicos e outros materiais que também são sepultados.

Outros animais morrem de forma isolada, um aqui outro acolá. Suas carcaças ficam expostas ao tempo, aos predadores e aos agentes decompositores que se encarregam de neutralizá-la, reaproveitando seus nutrientes e reabsorvendo-a de volta ao solo. O ser humano enterra os seus, e isto por si só não seria um problema se não o fizéssemos em escala industrial, depositando centenas, milhares de carcaças em espaços pequenos, os cemitérios. E ainda os sepultamos profundamente, longe da superfície... e pertinho dos lençóis d’água subterrâneos.

Junte-se a isso o próprio processo natural de decomposição. Todo corpo em putrefação libera gases tóxicos como metano, amoníaco e sulfeto de hidrogênio, extremamente venenosos, e produz um líquido conhecido como necrochorume, que é um composto de líquidos corporais e microorganismos – muitos deles patógenos e responsáveis por velhas conhecidas como tétano, hepatite, disenteria, escarlatina, tuberculose e febre tifóide (puta que pariu!). Cada cadáver libera, em média 200ml dessa gosma todos os dias por pelo menos 6 meses. Noves fora, são quase 40 litros! Agora imagine um cemitério com 1000 corpos... a meleca se torna gigantesca – e vai tuuuuudo pro lençol d’água, que abastece o reservatório que envia água para a caixa que a manda para as torneiras e o chuveiro... da sua casa. Se você abastecer sua residência com poço então... virge!

Por último, como se já não bastasse isso tudo, ainda temos a tosca tradição de enterrar nossos mortos embalsamados e lacrados em caixões. Existem dados assustadores sobre o que enterrar tanta gente dessa maneira custa ao meio ambiente. Segundo Joe Sehee, diretor executivo da Green Burial Council, todos os anos nos EUA os caixões usados em funerais lançam no solo mais metal do que tudo o que foi usado para erguer a ponte Golden Gate, em San Francisco, e os gavetões das sepulturas têm concreto suficiente para construir uma avenida de duas pistas ligando Nova York a Detroit – quase 1000km (os dados foram coletados pela Association of American Cemetery Superintendents). Em 2009, os americanos injetaram no solo inacreditáveis 3,1 milhões de litros de formol e outros fluídos para embalsamamento, além de 104 mil toneladas de aço e 2.700 toneladas de bronze. Isso sem contar os quase 850 mil metros cúbicos de madeira (de acordo com Casket and Funeral Association of America, Cremation Association of North America e The Rainforest Action  Network) o que não seria exatamente um problema, se tal madeira não fosse invernizada e pintada e tratada com pesticidas para resistir à ação de cupins, formigas e traças (pra quê!?). Olha que merda! Quer mesmo ser enterrado e se tornar responsável por poluir a água e contaminar o solo com um sem-número de substâncias nocivas?

Cova coletiva no campo de concentração de Bergen-Belsen, Alemanha, em
maio de 1945. O problema maior não é enterrar do corpo, mas sim acumular
grande número de cadáveres no mesmo lugar.

Beleza, então nada mais de enterrar, vamos cremar todo mundo! É rápido, não ocupa espaço e não contamina água nem solo. Parece perfeito, mas na verdade é uma péssima ideia – outra, aliás. Cada cremação libera em média nada menos que 150kg a 250kg de CO2 (mais conhecido como dióxido de carbono, um dos principais gases responsáveis pelo efeito estufa) e até mercúrio, se você tiver obturações e/ou marcapassos no corpo. Mercúrio é um metal pesado e assombrosamente venenoso – os japoneses de Minamata que o digam. Quer mesmo ser cremado e se tornar responsável por poluir nossa atmosfera e esquentar ainda mais o planeta?

Cremação hindu às margens do rio Ganges, na Índia. Tal hábito
ajudou a colocar aquele rio entre os mais imundos do planeta.

Mas o que isso tem a ver com religião, seu ateu fundamentalista!? Com certeza alguém que ler esse texto vai pensar isso – e vai postar a mesma coisa nos comentários (como anônimo, claro). Já disse que não sou fundamentalista e outra: enterrar mortos é um hábito religioso SIM. Tá, os neandertais já o faziam e não tinham religião, mas o problema é que a religiosidade maximizou tal tradição. Na África por exemplo, algumas tribos confiavam o destino de seus corpos à animais carnívoros como as hienas, mas a colonização europeia condenou o hábito ao ostracismo. E outra: para os cristãos a cremação não é uma opção, uma vez que o corpo precisa ser preservado para o Dia do Juízo Final, quando supostamente o Jesus vai voltar e ressucitar os mortos para a vida eterna... ai ai...


Em alguns países a superlotação de cemitérios se transformou num problema tão grave que o governo já estuda simplesmente dissolver os mortos e jogá-los no esgoto! Se duvida pode conferir aqui. Aqui no Brasil a gente não fica muito atrás não, dada nossa tecnologia rudimentar e total falta de interesse, tanto político quanto público, no assunto. Ao final da postagem há uma lista com várias reportagens a respeito do problema em vários pontos do país.

Depois de tanta notícia ruim, tinha que haver esperança né? 

E por mais incrível que pareça... há! A onda agora são os “enterros verdes”.

Um "exemplo" é o oferecido pela Neptune Society, que construiu um cemitério submarino nas proximidades de Miami (EUA). Os corpos são cremados e as cinzas misturadas a um cimento especial que é depositado no fundo do mar, criando um substrato perfeito para que corais , cracas e outros invertebrados se fixem e cresçam. Eu particularmente não gostei, pois eles ainda precisam cremar as carcaças antes, fora o fato de que alteram o ambiente marinho pra fazer isso, alegando que será ótimo para que a vida marinha se desenvolva ao redor das estruturas.

Leões guardam os portões do cemitério submarino da Neptune Society: mal
gosto e falsa ideia de enterro ecologicamente sustentável.

Outro processo, mais interessante, foi desenvolvido pela Green Burial Council. Consiste em não aplicar agentes conservantes no cadáver e depositá-lo em um caixão feito de galhos de madeira fina, facilmente absorvível, enterrando-o diretamente na terra, sem gavetões de concreto. É melhor do que o método tradicional, mas elimina apenas o problema dos químicos e dos materiais sólidos. Continua ocupando espaço e arriscando a água subterrânea. Há também as opções de caixão de vime, papel reciclado e até sem caixão nenhum! É, o corpo é sepultado diretamente no solo.

Existe também o resomation. Tal método consiste em mergulhar o corpo numa solução de hidróxido de potássio (um corrosivo infernal,  popularmente conhecido como potassa cáustica), adicionar pressão e aquecê-lo a 180ºC. Tudo é dissolvido em três horas, restando apenas um líquido repleto de compostos orgânicos mas SEM agentes patógenos (destruídos pela alta temperatura), excelente para adubagem, e os ossos mais resistentes. O problema: ainda utiliza alguma energia e emite carbono. Bem menos, mas emite.

Cadáver após o processo de resomation: Apenas ossos limpos.
O sonho de todo osteotécnico – como eu – era ter essa máquina...

Agora vamos à mais fantástica de todas!

Já demonstrei em outras postagens (como esta e esta) o quanto admiro a região europeia da Escandinávia. Tenho várias boas razões para isso: além de reunir algumas das nações mais ateias e por consequência inteligentes do planeta (o que por si só já explica seu sucesso), elas são também as melhores das melhores dentre praticamente todos os indicadores sociais imagináveis. Expectativa de vida, desenvolvimento humano, corrupção, pacificidade, taxa de mortalidade, direitos humanos, igualdade e LIBERDADE sexual (uhuuuw!)... isso tudo sem nenhuma das tão festejadas maiores economias do planeta. E olha que nem citei ainda a Nokia, a Volvo e – principalmente! – a Victoria Silvstedt!


Uma das melhores coisas que a Suécia já fez. Tá, ela não tem
muito a ver com a postagem... mas você não vai reclamar, né!?

E a algum tempo atrás eles novamente deram outra demonstração do quanto podem tornar o mundo mais bonito. Mais especificamente, os suecos. Criaram, na opinião deste blogueiro, a forma menos ambientalmente agressiva de se tornar um cadáver. Para uma criatura tão ruim, mas tão ruim que, nem quando morre, deixa o planeta em paz, é uma excelente saída.

O negócio consiste em congelar, esmigalhar e enterrar o corpo, num processo conhecido como promession, que usa uma técnica chamada freeze-dry. O primeiro passo é mergulhar o cadáver em nitrogênio líquido, a – 196ºC, o que o torna extremamente quebradiço. Em seguida, a peça congelada é colocada sobre uma esteira vibratória e, em questão de minutos, tudo vira pó. Equipamentos filtram a água e um ímã retira qualquer metal de próteses, obturações e etc. O que fica (aprox. 20kg a partir de um corpo de 80kg) é colocado em uma caixa de amido de batata ou milho e enterrado em uma cova rasa para que se plante uma árvore em cima. Ela vai absorver seu “corpo”, crescer com seus nutrientes e, desta forma, entre 6 meses a 1 ano, seus restos desaparecem por completo e você passa a fazer parte da própria árvore. Não é demais!?



A coisa é tão boa que já existem cemitérios americanos e ingleses que importaram a técnica. Vou ficar torcendo para que alguma empresa a traga para o Brasil por um preço razoável... como biólogo, adoraria virar uma árvore!


A coisa deve ficar particularmente legal para os fãs de Terminator... você será
estilhaçado como o T-1000! Só que não vai poder voltar mais não...


Agora imaginem... ao invés de ter aqueles jazigos imensos, caros e de absoluto mal gosto (ou alguém realmente acha aquelas imagens enormes, cheias de sujeira, mofo e cocô de pombo bonitas?) teríamos jardins familiares, com cada árvore representando um ente familiar e ainda ajudando a capturar o CO2 da atmosfera! FANTÁSTICO! Esses suecos...


Ao invés dessas lápides podres, velhas, sem cor e
caindo aos pedações...
... vamos ter um jardinzão colorido, cheio de vida
e no qual dá vontade de estar e passar um tempo.

Enquanto isso, 80% dos brasileiros são enterrados em cemitérios, e 75% destes não respeitam normas técnicas e poluem o ambiente...

Para saber mais, veja os links abaixo. Você terá algumas informações a respeito de:

01) opções para ir dessa para melhor sem dar uma última cutucada na ferida do mundo

02) problemas de superlotação de cemitérios em:
Manaus (AM)

03) outras curiosidades a respeito de você... morto, AQUI e AQUI também. Ah sim, e você também pode pensar em uma das 10 maneiras estranhas de se "viver" após a morte.

E se o seu problema não é exatamente a destinação do corpo, mas sim se vai ser julgado e condenado ou condecorado por seus atos na Terra, fique com as belíssimas palavras de um grande pensador: